Usina Teles Pires

Joana Martins, Ana Luiza Nobre e David Sperling

PA, Brasil

9°20'53" oeste e 56°46'30" sul.

“Nós não estamos fazendo caminho em terra alheia, não estamos invadindo a terra de outros. Nós estamos fazendo o nosso caminho." Juarez Saw Munduruku, cacique da aldeia Sawre Muybu

Publicado em
20/10/2022

Atualizado em
02/12/2022

Na divisa dos atuais estados do Pará e do Mato Grosso corre o Rio Teles Pires, território ancestral dos indígenas Munduruku.

O rio que cruza o cerrado até chegar à floresta amazônica, numa extensão de quase 1.500 km, atravessa hoje terras devastadas pela monocultura e pelo agronegócio, e é atravessado por um complexo hidrelétrico formado por seis usinas. Quatro delas, construídas entre 2011 e 2014, já estão em funcionamento. E essas são apenas as primeiras obras de um plano de industrialização da bacia do Tapajós que envolve a construção de mais de 40 hidrelétricas, uma hidrovia, portos graneleiros e uma ferrovia. Tudo para fazer chegar a outros continentes os grãos produzidos no interior do país, de acordo com uma política energética e desenvolvimentista de claro viés colonializante.

As obras da construção da Usina Hidrelétrica Teles Pires destruíram a cachoeira Sete Quedas, lugar sagrado para os indígenas Munduruku, onde eram tradicionalmente depositadas as urnas funerárias de seus antepassados. À sua revelia, 12 urnas foram desenterradas por arqueólogos e entregues ao IPHAN e à Funai.

Em protesto pela restituição das urnas, mais de 200 indígenas do povo Munduruku, representando 138 aldeias, ocuparam e paralisaram em 2017 o canteiro de obras de outra usina em construção no rio, numa ação encabeçada por mulheres e pajés da etnia. As demandas incluíram um pedido de desculpas, uma indenização, o fim da construção de hidrelétricas no rio e a restituição das urnas. Sem obter resposta, na madrugada do Natal de 2019 um grupo de indígenas entrou no Museu de História Natural de Alta Floresta e resgataram as urnas, para levá-las de volta ao seu território.

Só os pajés, em comunicação com os espíritos dos ancestrais, podem determinar o destino das urnas. Mas restam ainda 270 mil artefatos recolhidos por arqueólogos e levados para o Instituto do Homem Brasileiro em Cuiabá, Mato Grosso. Se cumprida a condicionante estabelecida na Licença de Operação da Usina de Teles Pires, o destino dessas peças poderá ser uma Casa da Memória a ser construída em Jacareacanga, Pará. Enquanto isso se arrasta, junto com a demarcação das próprias terras indígenas, a aldeia Sawré Muybu desenhou num “Mapa da Vida” toda uma complexa rede que implica os planos subterrâneo e terrestre na sustentação da cosmologia e territorialidade dos Munduruku, e não deve ser tocada jamais.

Ocupação Munduruku no canteiro de obras da Usina São Manoel. Foto: Caio Motta. (1)

Ocupação Munduruku no canteiro de obras da Usina São Manoel. Foto: Caio Motta. (1)

Objetos, muitas vezes sagrados, retirados de seus territórios de origem pela colonização, compondo acervo de museu europeu. (2)

Objetos, muitas vezes sagrados, retirados de seus territórios de origem pela colonização, compondo acervo de museu europeu. (2)

Povo Munduruku produzindo o Mapa da Vida. (3)

Povo Munduruku produzindo o Mapa da Vida. (3)

Movimento de Ocupação Munduruku na UHE São Manoel