Monumento às Bandeiras
Joana Martins, Ana Luiza Nobre e David Sperling
Brasil
23°34'47" oeste e 46°39'38" sul.
Publicado em
22/09/2022
Atualizado em
02/12/2022
Nascido dos esforços de mobilização nacional que precederam o centenário da independência brasileira, o monumento às Bandeiras – obra mais emblemática do escultor ítalo-brasileiro Victor Brecheret – seria realizado em versão reformulada por ocasião das celebrações dos 400 anos da cidade de São Paulo, comemorado em 1954.
O monumento instalado em espaço público de grande visibilidade junto ao Parque do Ibirapuera tem 40 metros de extensão e representa, em 240 blocos de granito esculpido, dois homens caucasianos montados em cavalos, à frente de uma caravana composta por diversas etnias e uma canoa empurrada por um indígena. As figuras humanas geometrizadas em estilo art déco se projetam para a frente, num grande esforço ascensional. Trata-se de uma das maiores homenagens públicas aos bandeirantes que, durante o século XVII, adentraram os sertões ainda não colonizados do interior do Brasil, conquistando territórios indígenas. Fixados como heróis nacionais, são glorificados nas bases laterais do monumento como desbravadores “que traçaram o nosso destino na geografia do mundo livre”, “vergando a vertical de Tordesilhas”.
Não por acaso, os corpos em pedra estão posicionados em direção noroeste, no sentido da marcha de expansão territorial do Brasil. O local também é carregado de simbolismo. Antes do Parque Ibirapuera, construído simultaneamente ao monumento, havia ali uma aldeia indígena.
Chama atenção a presença de uma única figura feminina na obra: uma indígena, segurando um bebê, como que aludindo à miscigenação dos europeus com os autóctones – ou aos estupros de mulheres indígenas que contribuíram para povoar o Brasil.
Durante a ditadura civil-militar brasileira, o monumento foi alvo pela primeira vez de um protesto político, com o ensacamento das cabeças dos bandeirantes em alusão à conhecida técnica de tortura utilizada pelos militares. Contestações ao teor escravagista e racista da obra se intensificaram a partir de 2013, em meio ao debate crescente sobre memória e reparação que ganhou força ao redor do planeta com a derrubada de monumentos públicos na Europa e Estados Unidos. Pichações, banhos de tinta vermelha, nada parece suficiente, porém, para interromper de vez com a longa glorificação dos bandeirantes como responsáveis pelas origens da expansão do território brasileiro, que segue servindo de inspiração para o mais perverso nacionalismo.
Projeção mapeada no Monumento às Bandeiras
Referências
DEMONUMENTA. Monumento às Bandeiras. 2021. Disponível em: http://demonumenta.fau.usp.br/demonumenta/252. Acesso em: 12 jul. 2022.
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SMC - DPH. Inventário de Obras de Arte em Logradouros Públicos da Cidade de São Paulo: Monumento às Bandeiras. 2008. Disponível em: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/cultura/patrimonio_historico/adote_obra/index.php?p=4526. Acesso em: 12 jul. 2022.
TUPÃ, Marcos. “Monumento às Bandeiras homenageia aqueles que nos massacaram”, diz liderança indígena. 2013. Disponível em: https://revistaforum.com.br/movimentos/2013/10/5/monumento-s-bandeiras-homenageia-aqueles-que-nos-massacaram-diz-liderana-indigena-7641.html. Acesso em: 12 jul. 2022.
VALVERDE, R. R. H. F. O sentido político do Monumento às Bandeiras, São Paulo: condições e oportunidades para a multiplicação de narrativas a partir da transformação do espaço público. PatryTer, [S. l.], v. 1, n. 2, 2018. DOI: 10.26512/patryter.v1i2.10117. Disponível em: https://periodicos.unb.br/index.php/patryter/article/view/10117. Acesso em: 12 jul. 2022.
Imagem 1: https://artebrasileiros.com.br/opiniao/bandeirantes-em-movimento-entre-disputas-e-conciliacao/
Imagem 2: https://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%9Altimos_momentos_de_um_bandeirante#/media/Ficheiro:Bernardelli,_Henrique_-_%C3%9Altimos_Momentos_de_um_Bandeirante.jpg
Imagem 3: https://artsandculture.google.com/asset/domingos-jorge-velho-e-o-loco-tenente-ant%C3%B4nio-f-de-abreu-benedito-calixto-de-jesus/4gGux1QNnYdLIA?hl=pt-br