GRU

David Sperling

SP, Brasil

23°25'27" oeste e 46°28'28" sul.

Atenção senhores trabalhadores, embarque para a obra do Aeroporto pelo Terminal 3

Publicado em
27/09/2022

Atualizado em
20/10/2022

A torre de comando paira soberana no horizonte do entorno do GRU Airport. Durante a expansão do terminal 3, as gruas passaram a lhe fazer companhia. Havia todo um fino diálogo ali.

Para além de marcos urbanos, gruas e torre de comando funcionavam como reguladores das ordens sociais instaladas no aeroporto durante a obra. Naquele contexto, eram os correlatos contemporâneos das chaminés e dos campanários – o tempo fabril e o tempo religioso – da modernidade tratada por Jean Starobinski.

Vistas a partir do Jardim Lídia e Jardim Malvinas, bairros da periferia de Guarulhos, ganhavam ainda mais concretude, outra crueza.

Nesses Jardins foram encontrados alojamentos clandestinos de trabalhadores em condições análogas à escravidão. Trabalhadores da obra do aeroporto. Da obra administrada pela empreiteira que compunha a empresa concessionária desse mesmo aeroporto. Formada por um conjunto de articulações entre empresas de investimentos e participações, empreiteiras, fundos de pensão estatais e órgãos governamentais, que perfaziam todo um empreendimento de controle do aeroporto – de sua ampliação às várias nuances de sua gestão.

O controle da GRUPar (detentora de 51% dos ativos sociais do GRU Airport) era dividido entre a Invepar (Investimentos e Participações em Infraestrutura S.A.), com 80%, e a Airports Company South Africa SOC Limited (ACSA), empresa estatal sul-africana, gestora de aeroportos, detentora de 20%. Por sua vez, o controle da Invepar – empresa criada no ano de 2000, para explorar concessões de infraestruturas de transporte no Brasil – era partilhado paritariamente entre o Grupo OAS e fundos de pensão estatais.

No contexto da ampliação, o número 111 diz respeito à quantidade de trabalhadores oriundos dos Estados do Maranhão, Pernambuco, Sergipe e Bahia, encontrados em situação análoga à escravidão no canteiro de obras da construção do Terminal 3 do Aeroporto de Guarulhos. 

É  também número emblemático que replica, duas décadas depois, a quantidade de detentos mortos no Massacre do Presídio Carandiru, em 1992.

Mas, os 111 do GRU são apenas a parcela identificada de um total de 2366 trabalhadores migrantes de fora do Estado de São Paulo que compuseram a mão-de-obra no canteiro da empreiteira OAS S.A., segundo estimativa do Ministério Público do Trabalho. Os 111 do GRU representam ainda um número bem maior, que remonta à própria relação entre a cidade de Guarulhos e a construção do aeroporto.

Entre o GRU e os 111 existe uma fina relação, pela qual a mesma empresa participa de empreendimentos aparentemente contrastantes. Por um lado, é capaz de gerir todo o complexo aeroportuário que responde a normas internacionais de segurança e operação da aviação. E, por outro, atuar em uma logística de aliciamento e utilização de mão-de-obra análoga ao escravo no canteiro de obras, por meio de atravessadores. 

No lugar onde nenhum descontrole fortuito é permitido, tudo é logística, confiabilidade e máxima eficiência.

As gruas e aqueles trabalhadores não estão mais lá, mas a torre de comando permanece soberana no horizonte do GRU Airport.

GRU - Foto: Stefano Wrobleski. (1)

GRU - Foto: Stefano Wrobleski. (1)

Alojamento dos trabalhadores aliciados pela OAS - Foto Marcelo Camargo/Agência Brasil. (2)

Alojamento dos trabalhadores aliciados pela OAS - Foto Marcelo Camargo/Agência Brasil. (2)

Foto: Luciano Bernardino/GRU-111. (3)

Foto: Luciano Bernardino/GRU-111. (3)

Foto: Luciano Bernardino/GRU-111. (4)

Foto: Luciano Bernardino/GRU-111. (4)

Foto: Stefano Wrobleski. (5)

Foto: Stefano Wrobleski. (5)

GRU - Divulgação/Facebook GRU Airport. (6)

GRU - Divulgação/Facebook GRU Airport. (6)

Torre de Controle GRU - Foto: Rodrigo Barreto. (7)

Torre de Controle GRU - Foto: Rodrigo Barreto. (7)

TERMINAL 3 - Direção: Thomaz Pedro e Marques Casara

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