Farrapos
Joana Martins, Ana Luiza Nobre e David Sperling
RS, Brasil
30°2'11" oeste e 51°12'57" sul.
Publicado em
23/08/2022
Atualizado em
02/12/2022
No conturbado período regencial do Brasil, em que muitas revoltas e insurgências republicanas questionavam o governo imperial, a de maior destaque é a Revolução Farroupilha. A guerra civil mais duradoura da história brasileira foi deflagrada no interior da então província de São Pedro do Rio Grande do Sul.
Assim como em outras revoltas da época, o alto preço dos impostos foi determinante para que a elite gaúcha – já insatisfeita com a presença das tropas imperiais na província, em decorrência da Guerra da Cisplatina – se levantasse contra o imperador. No século XIX, o principal alimento dos escravizados, concentrados no sudeste e nordeste, era a carne produzida no sul do país. Comprada dos produtores de gado, ou estancieiros, era transformada em carne-seca (charque) pelos charqueadores, o que garantia sua conservação por mais tempo. Mas como o charque gaúcho era mais tributado pelo governo federal do que o produzido no Uruguai ou Argentina, seu preço era menos competitivo.
Por isso os grandes produtores se organizaram e ocuparam a capital da província, Porto Alegre, cujo presidente foi deposto. Iniciou-se assim a Guerra da Farroupilha, num movimento que se espalhou por outras regiões do Rio Grande do Sul.
Apesar de iniciada e comandada pela elite e classe média gaúcha, as batalhas contaram com a ajuda de escravizados, atraídos pela falsa promessa de que seriam alforriados se defendessem os republicanos. E como os combatentes escravizados eram mal-vestidos, foram apelidados de “farrapos”, dando nome à revolta.
A predominância negra na frente de batalha não configurou um movimento abolicionista, apesar de independentista. Muitos dos estancieiros e charqueadores possuíam grande número de escravizados, cuja venda ajudou a financiar a revolta. E há indícios de que, próximo à resolução do conflito, armou-se uma emboscada para exterminar os negros e evitar um possível levante caso os escravizados não fossem libertados ao final da guerra, no que ficou conhecido como “Massacre dos Porongos”.
Ainda menos reconhecida do que a presença negra na guerra é a participação indígena, embora alguns estudos apontem para sua contribuição também na linha de frente nas batalhas.
A Guerra dos Farrapos se estendeu por 10 anos, vitimou cerca de 30.000 pessoas e influenciou outros levantes pelo Brasil, como a Revolução Liberal de São Paulo (1842) e a Sabinada na Bahia (1837). Com a perda progressiva do apoio popular, o desfecho se deu mediante uma negociação com o governo imperial que garantiu a taxação do charque estrangeiro, a escolha do próximo presidente da província e a anistia dos revoltosos. Além da separação da província e o surgimento da República Rio-Grandense.
O levante é celebrado como símbolo da identidade gaúcha e tem seus líderes homenageados em escolas, praças, ruas e nomes de cidades do atual estado do Rio Grande do Sul, onde o colapso político e econômico do Brasil faz crescer movimentos separatistas, em meio às celebrações pelo bicentenário da Independência do país.
Referências
DORNELLES, L. de L. Guerra Farroupilha: considerações acerca das tensões internas, reivindicações e ganhos reais do decênio revoltoso. Revista Brasileira de História & Ciências Sociais, [S. l.], v. 2, n. 4, 2010. Disponível em: https://periodicos.furg.br/rbhcs/article/view/10409. Acesso em: 4 ago. 2022.
NEUMANN, E. S. "Um só não escapa de pegar em armas": as populações indígenas na Guerra dos Farrapos (1835-1845). Revista de História, [S. l.], n. 171, p. 83-109, 2014. DOI: 10.11606/issn.2316-9141.rh.2014.89008. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/revhistoria/article/view/89008. Acesso em: 4 ago. 2022.
ZALLA, Jocelito; MENEGAT, Carla. História e memória da Revolução Farroupilha: breve genealogia do mito. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 31, n. 62, p. 49-70, out. 2011. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbh/a/xxQSzmDf7tjfMc67ZN7xsSx/?format=pdf&lang=pt. Acesso em: 04 ago. 2022.
Imagem 1: Retrato de um Lanceiro Negro, Juan Manuel Blanes
Fonte: Wikimedia Commons
Imagem 2: Anita Garibaldi, lider independentista dos Farrapos. Retrato feito enquanto viva pelo pintor italiano Gerolamo Induno, em 1849.
Fonte: Wikimedia Commons
Imagem 3: Carga de Cavalaria, Guilherme Litran, 1893
Fonte: Wikimedia Commons
Imagem 4: Ocupação Lanceiros Negros, Porto Alegre, 2015
Fonte:https://www.sindbancarios.org.br/index.php/ocupacao-lanceiros-negros-pede-dialogo-com-governo-do-estado-e-promete-resistir-em-caso-de-reintegracao-de-posse-violenta/
Imagem 5: Ponte da Azenha, local considerado como início do confronto entre os Farrapos e Republicanos
Foto: Tadeu Vilani/ Agencia RBS
Fonte: https://gauchazh.clicrbs.com.br/porto-alegre/noticia/2018/09/conheca-os-lugares-da-regiao-metropolitana-que-foram-marcados-pela-guerra-dos-farrapos-cjlzn0na501hy01mn69m1enbk.html