Árvore do Retorno

Joana Martins, Ana Luiza Nobre e David Sperling

Ouidah, Benin

6°20'24" leste e 2°5'19" norte.

Duas árvores na costa oeste da África e milhares de cativos em direção ao Atlântico, entre o esquecimento e o retorno.

Publicado em
30/09/2022

Atualizado em
03/07/2023

A chamada Costa dos Escravos, que hoje compreende os países do Togo, Benin e Nigéria, ferveu com o comércio negreiro, entre os séculos XVI e XIX. Só pela cidade costeira de Ouidah (Ajudá), na atual República do Benin, passaram cerca de 1 milhão de africanos escravizados em direção ao outro lado do Atlântico. A partir de 1994, um conjunto de monumentos e estátuas foi instalado aí no âmbito do projeto da UNESCO intitulado “A Rota do Escravo”. Marcos simbólicos – e às vezes estereotipados – que visam valorizar a memória da diáspora negroafricana e promover o turismo cultural na região refazendo os passos dos escravizados por um caminho de terra batida que vai da casa do mercador brasileiro Francisco Félix de Souza, no centro da cidade, até a Porta do Não-retorno, à beira-mar. 

A passagem pela Porta do Não-retorno era de mão-única, e representava uma viagem sem volta. Antes de embarcar nos navios negreiros, porém, os escravizados eram forçados a dar voltas na Árvore do Esquecimento para cortar os laços com sua terra, sua cultura, identidade e história e perder assim qualquer capacidade de reagir ou se rebelar. A árvore – supostamente um baobá – não existe mais, mas há um marco no local onde se acredita que ela tenha existido, colocando em cena essa prática.

Outra árvore, porém, oferecia uma sombra de esperança. De acordo com a crença Iorubá e a religião Vodu, as almas dos ancestrais podem retornar ao plano terreno. Para os escravizados que partiam rumo à morte, então, restava circundar a Árvore do Retorno, como modo de garantir que pelo menos uma parte do seu ser pudesse voltar, um dia, à terra-mãe.

Frame da vídeo performance ‘’L’Arbre D’Oublier’’, de Paulo Nazareth, em que o artista brasileiro, andando de costas, dá 437 voltas na Árvore do Esquecimento. 2013. (1)

Frame da vídeo performance ‘’L’Arbre D’Oublier’’, de Paulo Nazareth, em que o artista brasileiro, andando de costas, dá 437 voltas na Árvore do Esquecimento. 2013. (1)

’’Árvore do Esquecimento’’, Tiago Gualberto, 2012. (2)

’’Árvore do Esquecimento’’, Tiago Gualberto, 2012. (2)

Mulher escravizada algemada, Antilhas, Centro Schomburg. (3)

Mulher escravizada algemada, Antilhas, Centro Schomburg. (3)

Documentário atlântico negro na rota dos orixás

Paulo Nazareth - L’arbre d’Oublier [Árvore do Esquecimento], 2013