Oficina Lítica
Mariane Cardoso, Ana Luiza Nobre e David Sperling
SC, Brasil
27°37'44" oeste e 48°26'49" sul.
Publicado em
14/09/2022
Atualizado em
02/12/2022
As oficinas líticas são espécies de ateliês ao ar livre onde afloramentos rochosos eram usados por povos pré-colombianos na fabricação de diversos tipos de artefatos que compunham seu cotidiano. As marcas deixadas nessas rochas – também chamadas de “amoladores-polidores fixos” – tem diversos tamanhos e formatos e podem ser registros da produção de ferramentas de coleta, caça e pesca, como também de adornos ou objetos atrelados a rituais. Preparar e afiar a lâmina de um machado, por exemplo, exigia uma rocha dura, onde o gume pudesse ser desgastado. Já os zoólitos remetem a formas de animais ou entidades mitológicas, esculpidas segundo escolhas estilísticas e simbólicas muito próprias.
Essa sorte de objetos compunha um feixe de relações hoje desconhecidas. Mas sabe-se que os sulcos, frisos e depressões resultam de gestos repetitivos e fricções constantes nas pedras. Boa parte das oficinas líticas do Brasil concentra-se em costões do litoral com presença de rochas muito duras, como a Ilha de Santa Catarina, que possui mais de 30 sítios arqueológicos desse tipo identificados, uma das maiores concentração do país. Na mesma região também foram encontrados muitos sambaquis, montes antrópicos formados principalmente por camadas de conchas mas onde também são ocasionalmente encontrados artefatos (porventura esculpidos nessas rochas) atrelados a sepultamentos, o que pode indicar o uso desses elementos em práticas ritualísticas ou como forma de diferenciação social.
As oficinas líticas não se resumem, no entanto, nem a um suporte utilitário, nem aos costões da região Sul do país. Os Asuriní, povo tupi que habita as margens do rio Xingu, no Pará, relacionam os amoladores-polidores fixos do seu território ao seu ancestral criador, Mayra. Chamam as bacias de polimento de Mayra enewa ou Mayra apykauera e os polidores de gapypapera, vendo aí “as marcas dos pés e das nádegas de Mayra.” (SILVA, 2002, p. 182).
Referências
BUENO, Lucas; REIS, Lucas Bond [Orgs.]. Florianópolis arqueológica. Florianópolis: Editora da UFSC, 2021.
COMERLATO, Fabiana. Oficinas líticas do litoral central de Santa Catarina, Brasil. Cadernos do LEPAARQ, Pelotas, v. 7, n. 23, Jan-Jun de 2015.
SILVA, Fabíola Andréa. Mito e Arqueologia: a interpretação dos Asuniri do Xingu sobre os vestígios arqueológicos encontrados no Parque Indígena Kuatinemu – Pará. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, v. 8, n. 18, p. 175-187, dezembro de 2002.
SOPHIATI, Daniela Gadotti. Os amoladores-polidores fixos na paisagem da Ilha de Santa Catarina. Dissertação (Mestrado em Arqueologia Pré-histórica e Arte Rupestre) – Instituto Politécnico de Tomar, Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. Tomar, Portugal, 2011.
FERREIRA, Luciana; GERNET, Marcos de Vasconcellos. Desdobramentos da produção imagética – cultural e artística realizada no litoral Paranaense. In: ABRAHÃO, Cinthia Maria de Sena; et al [Orgs.]. Litoral do Paraná: território e perspectivas. v.2. Curitiba: Brazil Publishing, 2016.
TENÓRIO, Maria Cristina. Os amoladores-polidores fixos. Revista Arqueologia, v. 16, n. 1, pp. 87-108, 2003.
Imagem 1: https://www.flickr.com/photos/geraldocunha/15673938970/
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Imagem 4: https://www.flickr.com/photos/costao-do-santinho/51371252192/
Imagem 5: https://www.museunacional.ufrj.br/dir/exposicoes/arqueologia/arqueologia-brasileira/arqbra029.html
Imagem 6: Ana Luiza Nobre