Palácio-Convento de Mafra

Mariane Cardoso, Ana Luiza Nobre e David Sperling

Mafra, Portugal

38°56'13" leste e 9°19'33" sul.

Projeto megalômano de D João V, símbolo arquitetônico máximo da exploração desenfreada dos recursos das colônias portuguesas – em especial, do ouro brasileiro.

Publicado em
13/09/2022

Atualizado em
02/12/2022

Não se sabe ao certo que palavras D. João V, “O Magnânimo”, teria utilizado para pedir a Deus que lhe desse seu primeiro filho e sucessor, prometendo em troca a construção de um convento oferecido à Ordem de São Francisco – ou mesmo se tal promessa realmente foi feita.

Cumprida a parte divina, em todo caso, o rei pôs-se a honrar seu compromisso, selando a união entre dois poderes absolutos: o sacro e o soberano. Iniciou-se assim, em 1717, a construção do Convento de Mafra, nas proximidades de Lisboa, para abrigar 13 frades capuchos. Número que logo se multiplicou: passou a 40, depois a 80, até finalmente chegar a 330 religiosos. 

Como o projeto do arquiteto João Frederico Ludovice crescesse exponencialmente, foi preciso arrasar um morro localizado na face sul da edificação. E como o monarca queria demonstrar a grandeza do seu reinado ao resto do mundo, não poupou recursos para erguer uma das grandes obras do Barroco português: escadarias monumentais, salões profusamente ornamentados com mármore italiano, dois carrilhões com o maior conjunto sineiro do século XVIII, trazido dos Países Baixos, uma grandiosa biblioteca com cerca de 30 mil livros raros. Estima-se que no período mais intenso da construção, uma cidadela de cerca de 52 mil trabalhadores se formou em torno da obra. 

Poucos anos após o início dos trabalhos, decidiu-se construir também o Palácio Real junto ao Convento. Um gigantesco complexo arquitetônico se tornaria então uma das maiores expressões do poderio português, onde a Casa de Deus e a Casa do Rei se fundiam, como na origem da promessa.

Tais planos ambiciosos só poderiam se concretizar através de proventos exponenciais nunca antes vistos em Portugal. Eram os recursos das terras colonizadas que chegavam incessantemente e às toneladas, em navios abarrotados. Sobretudo o ouro extraído do solo brasileiro, que segundo estimativas somou entre mil e três mil toneladas transportadas para a capital do Império, entre os séculos XVII e XVIII.

O esbanjamento absurdo dessas riquezas foi revisitado pelo escritor português José Saramago, que fez do Palácio/Convento de Mafra o protagonista de sua obra-prima, “Memorial do Convento” (1982). O livro reconstitui ficcionalmente vários personagens verídicos: o arquiteto, o rei, o padre. E mapeia com precisão e olhar crítico as origens da fortuna impregnada nos 40 mil metros quadrados de um dos mais impressionantes monumentos de Portugal: “Está longe daqui o fundo dos nossos sacos, um no Brasil, outro na Índia, quando se esgotarem vamos sabê-lo com tão grande atraso que poderemos então dizer, afinal estávamos pobres e não sabíamos”.

Litografia do palácio de 1853, feita por João Macphail. (1)

Litografia do palácio de 1853, feita por João Macphail. (1)

Sala do Trono, onde também fica a coroa do rei. (2)

Sala do Trono, onde também fica a coroa do rei. (2)

Quarto do rei. À esquerda, uma pintura de D. João VI e acima da cama, a “Sagrada Família”. (3)

Quarto do rei. À esquerda, uma pintura de D. João VI e acima da cama, a “Sagrada Família”. (3)

Aquarela de 1810. (4)

Aquarela de 1810. (4)

4) ’’Construção do Convento de Mafra’’ de Roque Gameiro, presente em ‘’Quadros da História de Portugal’’ de 1917. (5)

4) ’’Construção do Convento de Mafra’’ de Roque Gameiro, presente em ‘’Quadros da História de Portugal’’ de 1917. (5)