Estrada Colonial do Planalto Central
Carolina Pifano
MT, Brasil
15°0'2" oeste e 59°57'49" sul.
Publicado em
25/09/2022
Atualizado em
30/09/2022
Por onde descrever um caminho? Parece ser convencional imaginar uma linha ora mais reta ora mais tortuosa para representá-lo. Essa é uma abstração que, para tentar chegar mais próximo de uma simples explicação, deixa escorrer pedaços pelas bordas, pois é rasa. E um caminho não é raso por parecer ser uma superfície onde os pés pisam ou as asas voam, é imersão nas dobras do mundo. Saiamos, então, de pontos geométricos de pouso para percorrer horizontes.
Horizontes que na região do Planalto Central reuniram diferentes andanças e rodanças em sua existência, ramos de caminhos se proliferam à demanda das ações humanas. Arquitetura de terra em extensão impressionante não somente em valores métricos de percurso, mas de uma história social espacializada e localizada. Muitos títulos foram atribuídos a esse conjunto de caminhos mapeados previamente por corpos não brancos e depois traçados em tinta enquanto ofício de posse e garantia de direitos sobre este.
Nomes para dizer deste itinerário ao mesmo tempo em que nega se tratar do mesmo caminho. Ora designam seus habitantes originários (Estrada dos Cuyabá), ora destacam suas principais mercadorias (Sal, Currais, Couros), contudo o aviso de autoridade monárquica (Estrada Real) e a reafirmação de sua condição de subserviência (Estrada Colonial) parecem perpetuar enquanto atualização de um passado idealizado. Êxito estratégico, a ferro e fogo o chão foi marcado como o gado por seu dono.
Ao mesmo tempo, este caminho guarda algo de indômito, acoberta o extravio e encabula a vigilância. Descaminhos ajuntados em Vila Bela, partem em outras cinco direções pelo continente para serem percorridos em terra ou em rios, a pé ou em mulas. Agora o pó de terra vira pó de pedra. Escavado, revirado, transportado, assentado. O asfalto não tomou todos os trechos, onde a poeira amarelada sobe com o vento, bocas ainda mastigam a rapadura feita no engenho para adoçar as histórias que contam de promessas.
Sobre uma terra prometida. À ela se busca, mas a ela não se chega e, novamente, de suas bordas jorram provisões e previsões de um outro futuro. De povoados nômades a cidades satélites, assim, estrutura-se a Estrada Colonial do Planalto Central. Escondem-se as minas de exploração, esconde-se a violência. Violência às gentes, violência ao chão. Trocam sua roupagem para ressignificar atitudes através de seu nome ainda carregado de colonialidade. Eufemismo do corpo feito nome dessa rota na qual a herança de exploração de seres se faz em outras proporções. Não havia aventura, percorrer por estes caminhos poderia significar o fim da vida, mas hoje suas trilhas, buscadas por bicicletas para a adrenalina em meio a natureza, pede para ser escutada para além do consumo do outro e de si.
Referências
BRASIL. C MARA DOS DEPUTADOS. . Estrada do Planalto Central. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/a-camara/visiteacamara/cultura-na-camara/historico/historico-de-paginas/estrada-colonial-do-planalto-central. Acesso em: 08 ago. 2022.
BARBO, Lenora de Castro; RIBEIRO, Rômulo José da Costa. Os itinerários da rede de caminhos de Vila Boa de Goiás no séculoXVIII. In: VI Simpósio luso-brasileiro de cartografia histórica. Atas. Braga: 2015. p. 437-450. Disponível em: https://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/14330.pdf. Acesso em: 08 ago. 2022.
Lima, Bárbara Lins. Abrindo Caminhos. In:Estrada Geral do Sertão : potenciais turísticos de um caminho quase esquecido (Dissertação mestrado).Universidade de Brasília: 2015. https://doi.org/10.26512/2015.07.D.19611. Acesso em: 08 ago. 2022
REBAS DO CERRADO. Estrada Colonial do Planalto Central. 2016. Disponível em: http://www.rebasdocerrado.com.br/indexInterno.php?url=artigos/textos/estrada_colonial.htm. Acesso em: 08 ago. 2022.
Imagem 1: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Palacio_da_Alvorada_Entrance_Hall.JPG
Imagem 2: http://cerratense.com.br/artcultura.html
Imagem 3: https://estradacolonial.com.br/
Imagem 4: https://www.mtbbrasilia.com.br/2012/11/12/estrada-colonial-do-planalto-central-2/
Imagem 5: https://doi.org/10.26512/2015.07.D.19611